“Vida e poesia são a mesma coisa”, escreveu Quintana, com acerto. E de uns tempos pra cá, tenho pensado muito naqueles versos do Drummond: “no meio do caminho tinha uma pedra/tinha uma pedra no meio do caminho”… Vida e poesia se mesclando. A pedra: de repente, a necessidade de submeter-me a uma cirurgia. Depois, talvez o pior: aguardar o resultado das biópsias. Assim, sobre aquele caminhar feliz, inesperadamente, densas nuvens, negras nuvens, e a pedra. Fazer o que? Lembrei-me de Saint-Exupéry: “o homem se mede diante do obstáculo”. Busquei a coragem necessária, calcada na fé, para enfrentar a dificuldade. E na antessala do centro cirúrgico, onde aguardava o efeito do medicamento para ser anestesiada, naqueles momentos de ansiedade e solidão, meu olhar encontrou um crucifixo na parede. Ali, abri meu coração para Ele e lembrei-Lhe dos meus sonhos ainda a realizar e a necessidade de cuidar da minha mãe, já indo para os 91 anos. Pedi-Lhe que me abençoasse, mas que prevalecesse a vontade Dele, pois só Ele sabia o que reservara para mim. Naquele exato instante, lembrei da bela frase de Nélida Piñon. “Sei que posso depositar a minha dor aos pés do Corcovado”. Relaxei e não vi mais nada. A operação foi bem sucedida e nos meus primeiros passos pós-operatórios, no corredor do hospital, ao avistar uma janela e para lá dirigir-me, estremeci com o que vi: lá estava o Redentor, de braços abertos na direção do hospital, como que a dizer-me: ouvi seu pedido!
Agora, já com os resultados negativos das biópsias, retomo a vida, agradecida, olhando o horizonte, e morrendo de vontade de passar uns dias de descontração e beleza na amada Saquarema!
Artigo publicado na edição de março de 2011 do jornal O Saquá (edição 131)