Decorrida a primeira década do novo século, chega-se à incontestável conclusão de que é inadiável começar a reforma política pela estrutura arcaica e oligárquica dos partidos. Em audiência na Câmara dos deputados para discutir a reforma política, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Ricardo Lewandowski, engrossou o universo de opiniões criticando o elevado número de partidos no Brasil, ressaltando que boa parte deles não tem, sequer, ideologia própria, ocasião em que manifestou seu pessimismo em relação à aprovação pelo Congresso, até o final de setembro, de uma reforma política para vigorar na eleição municipal de 2012. O excessivo número de partidos dificulta a governabilidade e muitos deles têm vida apenas no período eleitoral, valendo-se do Fundo Partidário que, diga-se de passagem, é bem generoso, e da franquia do horário eleitoral no rádio e na televisão para os mais diversos fins. É verdade que existem partidos históricos e ideológicos, mas muitos que precisariam refletir melhor acerca de suas existências.
Até poucos dias atrás, funcionavam 27 partidos no país, dos quais 22 com representantes na Câmara dos Deputados. Desses 22, oito têm, apenas, de um a quatro deputados. Como se não bastassem, acaba de ser criado o 28° partido que nada tem de diferente em relação aos 27 já existentes. Nada que os outros não prometam: democracia no processo decisório, apoio aos projetos de interesse do Brasil, combate à pobreza com geração de riqueza e defesa da classe média. Na verdade é um novo/velho, ressuscitado, o Partido Social Democrático, criado por Getúlio para abrigar correligionários fora do figurino trabalhista do PTB também fundado por ele. Velho porque o PSD existiu em meados do século passado, tendo JK como uma de suas principais lideranças que se elegeu presidente da República e levou a capital para Brasília. O perfil da maioria dos 33 parlamentares dos diversos partidos que assinaram a ata de fundação do PSD também é parecidíssimo: com raras exceções, fazem parte do baixíssimo clero. Estão deixando os partidos pelos quais se elegeram por falta de espaço para projetos pessoais (como o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab), por desavenças pessoais e pelo desejo de navegar no barco governista, visando a liberação de emendas orçamentárias com verbas para seus currais eleitorais. Além de cargos públicos, é claro.
O principal problema a ser enfrentado pela reforma é desmontar este quadro. As estruturas partidárias brasileiras resistem à tentativa de obrigá-las a se adaptarem a uma nova realidade, imposta por uma democracia agora constituída por 138 milhões de eleitores brasileiros ansiosos por uma participação política de melhor qualidade. A finalidade dos partidos tem que ser a de representar parcelas da sociedade, oferecendo bons candidatos para serem votados. Mas, na prática, os partidos acabam funcionando apenas como máquinas controladas e indiferentes, sem corresponder às expectativas dos eleitores. Prevalecem dentro dos partidos as retrógradas práticas herdadas da República Velha, com o domínio dos caciques sobre estruturas internas fechadas, impenetráveis, sempre temerosas do pluralismo e, por isso, nunca se comunicam com seus eleitores, num contexto que alguns cientistas políticos definem como sendo “uma partidocracia”.
Artigo publicado na edição de maio de 2011 do jornal O Saquá (edição 133)