Se rememorarmos, facilmente chegaremos a um retrospecto desanimador. Depois que PC Farias ultrapassou todos os sinais vermelhos, a ponto de provocar o impeachment de Fernando Collor, veio a Era Fernando Henrique Cardoso na qual surgiram alguns cuidados na separação entre o público e o privado. Foi, então, criada a Comissão de Ética da Presidência. Em seguida, nos oito anos de Lula, não só a Ética como também a Comissão foram pro brejo, numa dramática contribuição para degradar ainda mais a vida pública brasileira. Estranhamente, o Partido e o grupo de políticos que se apresentavam com bandeiras da ética e da reserva moral assumiram o poder em Brasília e, para espanto geral, fizeram exatamente o oposto, como se ecoasse um grito de “liberou geral”.
E assim, a partir de 2003, o modelo fisiológico do lulapetismo passou a implantar um projeto de poder e não de governo, onde tudo é válido: mensalão, aloprados, getulização do Estado e até doação de ministérios, como o dos Transportes, a partidos sem escrúpulos, mas predominantes neste sistema eleitoral que os transforma em base de sustentação para uma tal de “governabilidade”, termo técnico e pomposo sinônimo de “toma-lá-dá-cá.” Esse descarado toma-lá-dá-cá é que fertiliza a multiplicação de verdadeiras gangues nos ministérios, onde elas não só desviam dinheiro público, mas também fazem acertos com os comparsas para sobrepreços e aditivos aos contratos, visando o enriquecimento imediato das empreiteiras. Faz tanto tempo que se ouve falar em corrupção no Ministério dos Transportes que o país parecia já considerar um problema insolúvel. Tentaram até contornar o desgaste da sigla DNER, trocando-a por DNIT. Em vão. As imagens da presidente na campanha eleitoral, em deslocamentos pelo país, mostravam estradas sempre boas, numa jogada de marketing. Mas a estrutura de transportes no Brasil é calamitosa e produz estatísticas aterradoras com mortes e perdas econômicas. O Brasil tem 213 quilômetros de estradas pavimentadas; a Índia, com um terço do nosso território, tem 1,5 milhão.
Apesar de ter sido a mais poderosa executiva da história da Casa civil da Presidência da República, Dilma parece que não fazia a menor ideia da roubalheira que pavimentava as sinuosas estradas nos Ministérios dos Transportes e do Turismo. Lamentavelmente, nãos está descartada a possibilidade da presidente ter problemas no Congresso decorrentes de reações da classe política, embora pesquisa de opinião pública, encomendada pelo Palácio do Planalto, mostre que Dilma tem apoio dos cidadãos honestos, que não aguentam mais tanto impunidade, e crescimento no eleitorado de classe média que, no ano passado, votou no tucano José Serra. O professor de Ciência Política da Universidade de Brasília (UNB), Ricardo Caldas, reconhece que a atuação da presidente é positiva, no entanto, acredita que ela terá muita dificuldade para romper com práticas tão danosas quão arraigadas, algumas centenárias, como o nepotismo e o apadrinhamento político. Se, ao intervir nos Ministério dos Transportes e do Turismo, Dilma está abrindo campo de manobra para moralizar essas áreas, é imprescindível ocupar, imediatamente, esses espaços minados com demonstrações concretas de que uma relação política distorcida, semeada há oito anos e meio, acabou de fato. A conferir.
Cada cego vê com o olho que quer. Cuidados na separação entre o público e o privado na era FHC? Vide os casos: da superdesvalorização do Real (que também pode ser chamado de remoção da maquiagem ou a carruagem virou abóbora) quando muita gente com informação privilegiada se deu muito bem; o caso do Marco Aurélio Alencar e amigos, e seus inúmeros “acertos” na bolsa de futuros; o do banco Marka e Fonte Cindan (também da época da maxidesvalorização) cujo socorro custou alguns bilhões de prejuízo aos cofres públicos; a forma (não a venda) como se vendeu estatais a troco de moeda podre (para quem sabe o que isso significa); os inúmeros contratos com “consultores” no Ministério do Planejamento, todos substituídos por parcerias com Universidades Públicas (uso de nossa fonte intelectual mais valiosa) a partir do Mântega; falando em asfalto, o dinheiro das privatizações que até hoje não se sabe onde parou, posto que não foi feito um metro de estrada, um porto ou aeroporto; aliás, falando em asfalto, em Rio de Janeiro e Saquarema…
Finalizando, malha rodoviária federal asfaltada: em 1993 51612Km; em 2001 55998Km; em 2009 61920Km. (fonte DNIT)
Prezado Marcelo, esta é a sua opinião e, se você reparar, a matéia a qual você se refere também é uma matéria de opinião, no caso, do jornalista Silênio Vignoli, editor adjunto do jornal O SAQUÁ. Por ser uma coluna assinada, ela não reflete necessariamente a opinão do jornal. Fica aqui o registro. Até porque faz para da democracia ter opiniões diferentes.