Eles não foram contemporâneos e não tiveram oportunidade de se encontrar. Mas pelo talento e sensibilidade sinto-os próximos. Assim, pelas palavras de ambos, subvertendo o tempo e a impossibilidade, faz-se possível o belo e breve diálogo entre Lygia Fagundes Telles e Olavo Bilac.
Em seu romance “As Horas Nuas”, a preciosa escritora, em dado momento, indaga: – “Esperar é ter esperança?” E a resposta do Príncipe dos Poestas Brasileiros:
– “Esperança não é espera; não é qualquer expectativa, ansiosa ou fria, apaixonada ou indiferente… Assim, o condenado à morte, na sua cela, durante a noite de insônia e terror que precede a funesta alvorada ou ainda no momento em que ouve os passos do carrasco que o vem buscar, – está à espera da morte; mas não é essa a sua esperança; a sua esperança é a graça que o venha salvar, é o perdão que o venha à última hora libertar, é um cataclismo qualquer, que, subvertendo a ordem natural das cousas, venha impedir, ou pelo menos adiar o suplício, – é enfim a esperança da vida.
Também, nem todo o desejo é uma esperança, assim como não é uma esperança toda a ambição.
Em primeiro lugar, o que caracteriza essencialmente a esperança é o seu intuito bom e generoso. A ambição pode ser injusta, como o desejo pode ser malévolo ou criminoso. Mas a esperança é sempre boa. (…) “É o desejo ardente do bem próprio ou do bem comum, da felicidade própria ou da felicidade da comunhão. Outra consideração: a esperança é irmã gêmea da fé. Esperança é a fé no futuro: é a confiança no bem que se ambiciona. Esperar não é só desejar: é confiar. Já Platão dizia: “para alcançar qualquer coisa, é mister esperá-la com toda a alma”.
A esperança é natural e normal. Existe em todas as almas… Ela é o único bem real da vida, é o único que está ao alcance de todos, o único duradouro e sólido… Aristóteles definiu-a: “o sonho do homem acordado”. Há, porém, ditados populares, que a definem com mais propriedade: a esperança é o pão quotidiano dos que passam fome, é a felicidade dos infelizes…
Quase sempre o que estraga a Esperança é a impaciência, que é a sua “asa negra”, o seu gênio mau”.
– “E o que é a impaciência senão um sinal de imaturidade?“ Interroga e ao mesmo tempo responde Lygia Fagundes Telles (em “O Estado de São Paulo” de 16.11.95) – “O que caracteriza essencialmente a esperança (explica Bilac) é a constância no esperar. Há esperanças de fõlego curto, que não passam de desejos ardentes mas fugazes; as verdadeiras, as boas, as fortes esperanças têm voo largo e infatigável… A verdadeira esperança não se cansa de esperar: fixa-se no objeto do seu sonho, – como a âncora, que é seu símbolo, se fixa no fundo do mar. …Quem cansa de esperar não sabe esperar. …A esperança… pela sua constância e pelo seu fervor, é capaz de seduzir e vencer o destino… “conclui o poeta. (Trechos da Conferência “Esperança”, proferida no Salão Staeinway, em São Paulo. cf. Ed. Nova Aguillar S.A, 1996)
E finaliza Lygia, com chave de ouro: – “Sinto tristeza por meu país, mas o escritor não pode deixar de ter esperança. Volto sempre a Camões: “Não se aprende na fantasia, sonhando, imaginando ou estudando, senão vendo, tratando e pelejando”. O que fiz na vida? Venho pelejando com as dificuldades deste país que amo tanto. Se eu tivesse uma bandeira, seria vermelha, a cor da cólera e da paixão, e verde, a cor da ESPERANÇA”. (Entrevista à revista Entrelivros, ano 3, n° 29)