Não foi uma pequena insatisfação momentânea que levou multidões às ruas no meio do ano e fez a popularidade dos governantes cair a níveis inimagináveis. Essas manifestações deixaram um legado que não pode ser desconsiderado: a consciência de boa parte da população de como são mal aplicados os recursos provenientes de arrecadação da pesada carga tributária que nos é imposta. Pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), subordinado à Presidência da República, detectou demandas quase unânimes por melhorias em educação e saúde, nesta ordem, com índices de respostas acima de 80%, num universo pesquisado com faixa etária entre 15 e 29 anos de idade.
A menos de um ano das eleições de 2014 para o governo do Estado, pesquisa realizada pelo Ibope, entre 13 e 17 de novembro, totalizando 1.008 entrevistados, revelou que o percentual de votos brancos e nulos (27%) supera o de qualquer outro dos 9 candidatos. Os que não sabem ou não opinaram são 10% dos entrevistados.
Na avaliação do presidente do Ibope, Carlos Augusto Montenegro, a percentagem de votos brancos, nulos e de indecisos, a menos de um ano das eleições, em comparação com a eleição de 2010, é assustadora: “Isso revela o alto índice de insatisfação da população que não identifica um candidato que simbolize esse descontentamento”. Essa tendência de brancos e nulos dobrou após as manifestações do meio do ano. Dizem os especialistas que as pesquisas mostram um clima de insatisfação não com este ou aquele candidato, mas com a classe política em geral. E ainda não se pode prognosticar se a abstenção vai aumentar nessa mesma proporção.
Os partidos políticos articulam-se para 2014 como se nada tivesse acontecido de junho para cá. As manifestações mostraram os políticos longe do povo. Esse “ouvir o clamor das ruas” parece ser da boca pra fora. Segundo o professor de História e deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ), que está lançando o livro “A rua, a nação e o sonho”, é preciso considerar que hoje os partidos viraram partidos de negócio e a gente vive um processo de “peemedebização” da política, no pior sentido da palavra. O recado foi dado e as palavras de ordem na campanha eleitoral do ano que vem terão de ser idênticas às das manifestações do segundo semestre deste ano.
A população não parece disposta a abrir mão das prioridades de cidadania que os manifestantes trouxeram espontaneamente para as ruas, sem precisar dos partidos políticos ou de organizações sociais para guiá-los. As pesquisas qualitativas estão indicando que oscila entre 58% e 62 % a tendência dos eleitores de votar em branco, anular o voto ou abster-se de votar se perceberem que os candidatos continuam sem um projeto de país ou estado, mas apenas com um projeto de poder.