Um oceanógrafo formado pela UERJ, com doutorado pelo Ocean Research Institute, da Universidade de Tóquio, no Japão, ex-professor de química marinha na UERJ, pequisador associado da Fiocruz e oceanógrafo da Marinha do Brasil. Eis um rápido perfil do Dr. André Moreira, presidente do Instituto Lagrange, uma organização voltada para pesquisas ambientais, fundada em 2011, no Brasil, e creditada na ONU, com participação na Rio+20. Apaixonado pela Região dos Lagos, onde passou grande parte de sua infância e adolescência, especialmente em Araruama, André tem dois lotes em Ponta Negra, Maricá, onde pretende construir uma casa e viver sua futura aposentadoria. Mas foi na Lagoa de Saquarema que ele mergulhou quando fez o mestrado na UFF, em 1989. Em visita recente a Saquarema para uma reunião do Comitê de Bacia Lagos São João, em Bacaxá, André apresentou estudos preliminares da Lagoa de Jacarepiá, feitos em parceria com a AMILA, uma associação de moradores que existe há anos em Vilatur. Especialista em geoquímica, ele pesquisa minérios (utilizações, descarte e consequências), entre outros temas, especialmente o controle da poluição aquática. Crítico do atual sistema de saneamento na Região dos Lagos, André Moreira afirma que o descarte contínuo de fosfato é causa conhecida de poluição das lagoas de Araruama e Saquarema. “As Estações de Tratamento de Esgoto da região estão obsoletas e têm pouca eficiência”, considera o oceanógrafo.
O Saquá – Você é um especialista nas Lagoas de Saquarema e de Araruama. Qual a importância delas na sua vida pessoal e acadêmica?
André – Posso dizer que sou “cria da região”; minha família tem casa há 46 anos na Pontinha. Cresci nas margens das praias e lagoas, de Cabo Frio a Maricá, hora como pescador ou praticando esportes como vela, mergulho e surf em Saquarema. Esse contato frequente com as águas acabou me transformando num “homem do mar”, inclusive profissionalmente. Eu me formei como oceanógrafo pesquisador. Atualmente tenho acumulado cerca de 30 anos de experiência em monitoramento físico-químico de águas e em engenharia costeira. Fiz estudos em vários ecossistemas costeiros no Brasil, de norte a sul, e alguns em mar aberto. Na Região dos Lagos, realizei pesquisas sobre poluição, em 1988, na Lagoa de Saquarema e, em 2002-2003, na Lagoa de Araruama. Esses estudos têm interesse em termos de ciência de base, “ciência pura”, e também para diagnosticar ecossistemas.
O Saquá – Hoje estas lagoas continuam ameaçadas?
André – Todas as lagoas e lagunas têm um tempo de vida. Naturalmente, a tendência é de serem preenchidas por sedimentos, processo esse que é muito acelerado pelas atividades humanas. Como a sociedade precisa das lagoas para várias finalidades, ocorrem conflitos.
O Saquá – Como está a Lagoa de Jacarepiá que recentemente você visitou com um grupo de moradores de Vilatur?
André – Desde o ano passado comecei a fazer um estudo hidro-geológico sobre a Lagoa de Jacarepiá, em cooperação com moradores locais. A Lagoa de Jacarepiá é um ecossistema único de água doce. Atualmente, a lagoa encontra-se preenchida com muitos restos de plantas que poderiam ser retirados para melhorar as condições ecológicas. A Associação de Moradores local, a AMILA, em parceria com o INEA, tem feito plantios de mudas de árvores em torno da lagoa, o que é importante para a manutenção da fauna também. Porém, os planos de saneamento na região são preocupantes, pois muito esgoto que era dispensado nos sistemas de “sumidouros” poderão ter como destino final essa lagoa.
A legislação estadual e federal proíbe lançamentos de resíduos de esgotos em Reservas Ecológicas como Jacarepiá, o que com certeza ameaça várias espécies endêmicas da região que dependem desse habitat.
Portanto, acho necessário fazer um estudo de impacto ambiental para esta lagoa, pois nada disso vem sendo discutido no Comitê de Bacia Hidrográfica Lagos São João.
O Saquá – O que você sugere para proteção das nossas lagoas?
André – O controle sobre esgotos e erosão são importantes de maneira geral. Mas, cada caso é um caso. O caso da lagoa de Araruama é alarmante, pois essa laguna tem uma grande evaporação, o que faz concentrar os poluentes dos esgotos, ano a ano. A longo prazo, a única solução seria um emissário submarino. Para se ter uma ideia comparativa, a vazão de esgotos lançadas atualmente na lagoa de Araruama está em torno de 1m3/segundo, ou seja similar a do emissário da Barra da Tijuca. Para melhor conhecer cada caso de poluição, é importante fazer monitoramento das lagoas.
O Saquá – Qual a importância dos monitoramentos das águas das lagoas?
André –Por exemplo, os monitoramentos da composição química das águas são muito importantes para diagnosticar as condições e sugerir melhorias, funcionam como “hemograma”, a partir do qual se conhece melhor o caso para então receitar os ”remédios”. Com uma longa experiência em diagnose de águas, observo entretanto que os monitoramentos que têm sido feitos pelo Consórcio Intermunicipal Lagos São João (CILSJ), aprovados no Comitê da Bacia Hidrográfica Lagos São João (CBHLSJ), com recursos do Fundo de Recursos Hídricos (FUNDRI) e execução das concessionárias de água e esgoto da região, estão muito defasados tecnicamente. Como pesquisador especializado, não posso deixar de criticar a atuação deficiente do CILSJ nesse setor, até porque o Instituto Lagrange tem assento no Comitê Lagos São João. Outras tecnologias poderiam ser adaptadas à região, com melhor rendimento e mais baratas. Mas, na prática, não há vontade nem expertise técnica por parte das chamadas “câmaras técnicas” do CBHLSJ que se reúnem periodicamente, representadas mais por ativistas do que por técnicos… Nossas lagoas seguem cada dia mais poluídas e menos conhecidas.