Ele é coautor do livro “João Pernambuco, Arte de um povo”, biografia de um dos maiores violonistas do Brasil, escrita em parceria com Artur Luís Barbosa e lançada pela Funarte em 1982. Brasileiro profundo conhecedor das coisas nativas, o jornalista e poeta José Leal viveu nos últimos 30 anos na Alemanha, vítima das prisões e torturas do regime militar que se instalou no país a partir de 1964. Exilado na Europa, a maioria de seus livros foram então escritos e publicados em alemão, sem tradução para o português. Em 2014, José Leal publicou um livro de poesia no Brasil e agora volta ao gênero, com o seu “Livres e Ávidos Sentidos”, soprando “A energia revolucionária da poesia”.
Editado pela Pachamama Editora, no Rio, José Leal dedica o livro à memória da militante política e amiga Estrella Benaion Bohadana, recentemente falecida, a Inês Ettiene Romeu, única pessoa que saiu viva da “casa da morte”, em Petrópolis, depois de sofrer graves torturas, e ao “curumim” (menino) Vitor Pinto Kaingang, da aldeia Kondá, perto de Chapecó, em Santa Catarina, assassinado aos 2 anos, quando era amamentado no colo da mãe, na calçada da rodoviária de Imbituba, quando ia com sua família, pais e dois irmãos, ao litoral para vender artesanato indígena no primeiro dia do ano de 2016. José Leal é um homem bom e um poeta de mão cheia. Inspirado, vive sua poesia intensamente, com todos os sentidos. E vibra!
Para a professora de Filosofia da Arte Gretel Pauly, “José Leal em verso faz o reverso das sequelas provocadas pelas torturas na luta de resistência contra a ditadura”. É verdade. Tanto que foi frequentando a Clínica do Testemunho, projeto da Comissão de Anistia, do Ministério de Justiça, que o autor encontrou “a forma possível de re-conectar a ternura”, como explica a psicanalista Vera Vital Brasil, na introdução do livro: “Neste trabalho clínico direcionado a afetados pela violência do terror” José Leal extraiu do seu corpo machucado e dolorido a força da sua linguagem poética.
“José Leal atravessa com a palavra mágica da poesia, imprimindo a sua sensibilidade no acolhimento de dores alheias, das feridas na natureza, como a que se cometeu sobre o Rio Doce atingindo as populações ribeirinhas. Denunciando as violências atuais que recaem sobre os indígenas, sobre os imigrantes que buscam um lugar ao sol, impulsionando a amorosidade”, explica Vera. “Homenageando com a sua poesia a terra, as matas, rios, campos, mares, fauna e flora, a natureza dança a nossa volta”, continua. “E é na intensidade de sua vitalidade que José Leal nos ensina: ‘o corpo tempera as palavras’.
O surpreendente para Vera, é que se trata de “um corpo que havia sido massacrado e marcado pelo terror, pelo medo e aversão ao prazer, sob a batuta do mandato estratégico de submissão, típico dos tiranos”, mas é também “um corpo que deu lugar a uma lúdica e terna, delicada e generosa maneira de viver consigo mesmo e com os próximos”, sem esquecer a luta de quem foi e é hoje defensor: a da construção de uma sociedade justa e democrática. José Leal estará lançando seu livro no Museu da República no dia 3 de agosto, às 18:30h, no auditório Apolônio de Carvalho, no Catete, no Rio de Janeiro. Em breve, fará também uma noite de autógrafos em Saquarema.
Caminhando
Caminhando, revendo e seguindo
na luta em busca do sumo
das raras raízes
de um mundo melhor
Recriando, cultivando
o resumo da seiva
o sentido da luta
pelo húmus humano
profundo e maior.