A Reforma Protestante acaba de fazer 500 anos e foi comemorada em todo mundo onde existiu e existe o movimento reformista cristão, criado pelo ex-padre Martinho Lutero. No dia 31 de outrubro de 1517, o então monge católico Lutero proclamou na porta da Igreja de Wittenberg, na Alemanha, suas 95 teses, que marcaram o início da Reforma, um verdadeiro protesto contra a doutrina conservadora da Igreja Católica Romana. Apoiada por vários religiosos e governantes europeus, a Reforma Protestante gerou uma verdadeira revolução religiosa e social na Europa. Iniciada na Alemanha e espalhada pela Suíça, França, Países Baixos, Reino Unido, Escandinávia e partes do Leste europeu, principalmente Países Bálticos e Hungria, a Reforma atravessou o Oceano Atlântico e chegou ao Novo Mundo, influenciando o processo de colonização no Brasil, na América do Sul, e principalmente nos Estados Unidos, na América do Norte.
Com razões religiosas, políticas e sociais, a Reforma foi um confronto direto entre os católicos e os grandes nobres contra os pequenos nobres a emergente burguesia capitalista. Os pequenos nobres e príncipes e os capitalistas emergentes queriam se livrar da tributação papal que, apesar de defender a simplicidade, era a instituição mais rica do mundo. Eles também desejavam as terras da igreja. Na Alemanha, durante a Reforma, autoridades luteranas expulsavam das igrejas sacerdotes católicos, substituindo-os por religiosos luteranos, não raro à força, num clima de guerra.
Considerado herege pela Igreja Romana, Lutero foi processado, condenado e excomungado pela Igreja Romana, permanecendo exilado por um ano, durante o qual trabalhou na tradução da Bíblia para o alemão, impressa em 1522, com o nome de Novo Testamento. Enquanto na Alemanha a reforma era liderada por Lutero, na França o líder era João Calvino, um humanista, integrado ao clero romano, mas que não chegou a ser ordenado padre. Afastado da Igreja Católica, Calvino foi um representante importante do movimento protestante na França, tendo se exilado em Genebra, na Suíça, tornando-se importante referência para as Igrejas Reformadas.
Conflitos violentos se sucederam na Europa, nesta verdadeira guerra religiosa, entre eles o famoso Massacre de São Bartolomeu, da casa real francesa contra os calvinistas, em 1572, que deixou milhares de mortos e feridos. As igrejas reformadas propagavam a bíblia e suas ideias graças à invenção da tipografia de Johannes Gutenberg, que multiplicava as Bíblias publicadas em línguas nacionais, em vez do latim.
A reforma chega ao Brasil
Porém, a Reforma praticamente não penetrou em Portugal e Espanha, devido ao radicalismo da Inquisição católica, mas penetrou nas colônias. Em 1532, chegou ao Brasil o primeiro protestante, o luterano Heliodoro Heoboano, filho de um amigo de Lutero, que aportou em São Vicente (SP). Em 1557, uma missão francesa, enviada por Calvino, se estabeleceu numa ilha da Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro. Situada onde hoje está a Escola da Marinha, ao lado do aeroporto Santos Dumont, no Rio, na chamada Ilha de Villegagnon, a “França Antártica” foi o cenário do primeiro culto protestante no Brasil, talvez até na América. Mas numa colônia onde predominavam os católicos portugueses, fortemente armados, os franceses foram violentamente reprimidos. Até o padre Anchieta foi acusado de ter puxado a alavanca de enforcamento de um dos reverendos mortos.
Foi quando eclodiu a chamada Guerra dos Tamoios, em que os tupinambás eram aliados aos franceses, lutando contra os portugueses, aliados a outros indígenas, e padres jesuítas. Em sucessivas e sangrentas batalhas, os tamoios foram então sitiados no Campo de Maranguá, em Saquarema, no antigo Cabo Frio, onde comandantes franceses, caciques indígenas tamoios, predominantemente tupinambás, e quase toda a aldeia foram exterminados numa violenta batalha promovida pelos portugueses, quando foram degolados cerca de 500 guerreiros, na Praia de Jaconé, deixando um rastro de destruição que deixou a região deserta por cerca de 100 anos.
Em 1630, a Igreja Cristã Reformada, de protestantes da Holanda, se instalou em Recife, Pernambuco, no Nordeste Brasileiro, onde o conde Maurício de Nassau instalou seu governo que durou vários anos. Foram fundadas então 22 igrejas protestantes, com mais de 50 pastores, pregadores auxiliares e outros oficiais. Havia também muitos consoladores dos enfermos e professores de escolas paroquiais. A Igreja Cristã Reformada batizou índios, como também já faziam desde o início da colonização os padres jesuítas da Igreja Católica. Esse período se encerrou com a Guerra da Restauração portuguesa, na Europa, quando Nordeste foi devolvido a Portugal.
Durante a Monarquia, ocorreu a inserção definitiva do protestantismo no Brasil, quando se iniciaram as atividades missionárias, principalmente de organizações britânicas, americanas e germânicas. Porém, eram ações limitadas, pois a constituição imperial de 1824 reconhecia o catolicismo como religião oficial. As primeiras igrejas protestantes, com ação contínua, chegaram ao Brasil com a vinda da família real portuguesa, a partir de 1808, e se consolidaram com a abertura dos portos a nações amigas. Em 1811, comerciantes ingleses estabeleceram a Igreja Anglicana no país, seguindo-se da alemã Luterana, em 1824, da americana Batista, em 1871, da Metodista e da Adventista, em 1890. Em 1855, já havia chegado os missionários que trouxeram as Igrejas Congregacional, e a Presbiteriana, em 1859, voltadas ao público brasileiro.
Quase 30% da população
A separação entre estado e religião só aconteceu no Brasil com a Proclamação da República, no final do século 19, quando o país passou a gozar de uma relativa liberdade religiosa. A partir de então, o protestantismo floresceu, sendo hoje o segundo maior segmento religioso do Brasil. Segundo o Censo realizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 2010, os protestantes eram 22,2% da população brasileira. Segundo o Instituto de Pesquisa Datafolha , em 2014 os protestantes já seriam 29% da população do país. Entre as maiores denominações protestantes do Brasil estão os batistas, seguidos dos presbiterianos, luteranos, metodistas e adventistas. Entre os pentecostais, as igrejas têm maior número de seguidores na Assembleia de Deus, Congregação Cristã no Brasil, Universal do Reino de Deus, Igreja do Evangelho Quadrangular e Mundial, derivada da Universal. Nas últimas décadas, o protestantismo, principalmente as igrejas pentecostais e neopentecostais, tem conquistado cada vez mais um maior número de seguidores, principalmente no Paraná e Rio Grande do Sul, onde houve a grande imigração alemã, mas também nas grandes capitais do sudeste, São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, onde as igrejas batistas têm grande espaço e em Goiânia e Brasília, onde a igreja Sara Nossa Terra tem grande penetração. Calcula-se que hoje, o número de protestantes no Brasil já chega a quase 30% da população brasileira, enquanto os católicos são cerca de 60%. Nenhum estado brasileiro tem maioria protestante, embora os protestantes tenham tido um papel relevante na história de cidades fundadas por missões presbiterianas, de origem alemã, como no sul do Brasil e em Friburgo, no Rio de Janeiro.