Foi lançado o Álgum Biográfico “Guerreiras da Ancestralidade”, que reúne escritoras indígenas, começando por Eliane Potiguara, considerada a primeira escritora indígena brasileira, que acaba de lançar seu oitavo livro “O vento expalha minha voz originária”, pela Grumin Edições. Com capa do artista plástico indígena Jaider Esbell e na contracapa ilustração de Aline Kayapó, o novo livro de Eliane Potiguara, moradora de Jaconé, em Saquarema, dialoga com seu outro livro “Metade cara, metade máscara”, publicado em 2004 e já em terceira edição.
Pouco conhecida no município, apesar de morar em Saquarema há vários anos, onde também vive sua filha Tajira, seu genro Wellington e sua neta Taiane, além de seu filho Poti, que no momento não está na cidade, Eliane Potiguara é uma guerreira. Convidada a escrever o prefácio do Álbum Biográfico “Guerreiras da Ancestralidade”, Eliane é ainda uma das mulheres retratadas e homenageadas na publicação. Em seu perfil no Instagram, ela é descrita.
PRIMEIRA ESCRITORA INDÍGENA
“Eliane Potiguara, 72 anos, considerada a primeira escritora indígena do Brasil, recebeu em dezembro de 2021 o título de doutora “honoris causa”, do Conselho Universitário (Consuni), órgão máximo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Nossa ‘Madrinha inspiradora’, como carinhosamente a chamamos, ela também é Embaixadora Universal da Paz em Genebra (Cercle Universel des Ambassadeurs de la Paix, Genebra, Suíça). Essa maravilhosa contadora de histórias teve seu nome indicado, após a reunião do Círculo Universal dos Embaixadores da Paz, entidade ligada à ONU (Organização das Nações Unidas), para trabalhar a favor da paz no mundo.
Além de escritora, autora de “Metade Cara, Metade Máscara”, ela é poeta, ativista, professora, empreendedora social de origem étnica potiguara de seus avós, migrantes nordestinos. Se formou em Letras e Educação pela UFRJ e extensão em Educação e Meio Ambiente pela UFOP(Universidade Federal de Ouro Preto). Fundou a primeira organização indígena, o GRUMIN (Grupo Mulher – Educação Indígena) e Enlace Continental de Mulheres Indígenas. É Embaixadora da Paz pelo Círculo de Escritores da França. Participou da elaboração da Declaração Universal dos Povos Indígenas/ONU, por seis anos nas sessões em Genebra. Nossa guerreira, possui sete livros solos, teve seus textos publicados em diversos sites, antologias e e-books, nacional e internacional. Premiada pelo Pen Club da Inglaterra e Fundo Livre de Expressão (USA). Fonte: www.elianepotiguara.org.br e Instagram: @elianepotiguara.
ÁLBUM BIOGRÁFICO 2022
Dezemas de guerreiras da ancestralidade também compõem o Álbum Biográfico, entre elas Cátia Tupinambá, Célia Xakriabá, Chirley Pankará, Joenia Wapichana – presidente da FUNAI (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), Joziléia Kaingang, Lúcia Paiacu Tabajara, Márcia Wayna Kambeba, Margarida Alves, Raimundinha Tremembé, Shirley Krenak e Sônia Guajajara – ministra do Povos Originários. Em seu prefácio intitulado “São Sagradas as Mulheres Indígenas”, Eliane Potiguara denuncia o Marco Temporal que agride os direitos dos povos indígenas e acrescenta: “A demarcação das terras indígenas parou e a violência nelas cresceu. O Brasil e o mundo sofrem consequências das mudanças climáticas, do ar e da terra. A poluição do ar, dos alimentos e dos rios trazem enfermidades irreversíveis para a humanidade. A Conferência sobre Meio Ambiente, organizada pela ONU, em 1992, mobilizou o mundo inteiro contra os transtornos causados pelo desequilíbrio dos biomas. Mas as ações dos garimpeiros ilegais, envenenamento dos rios, narcotrafi cantes, milicianos, contrabandistas, grileiros, exploradores de madeira vêm tirando a vida de nossos povos”.
Além da defesa do pobres, Eliana denuncia o fato de que as mulheres indígenas são as mais afetadas. “São as que sofrem a violência física, psicológica, estupro e marginalização, nas cidades, quando afetadas em seu habitat. Vivemos na maior crise política, hídrica, ambiental, social, sanitária e financeira. A comida falta na mesa do trabalhador, a saúde está esfacelada sem sabermos quantos ainda morrerão pela Covid-19 e suas variantes. A malária, a tuberculose, o HIV, entre outras doenças derrubam os povos indígenas e quilombolas da Amazônia e do país inteiro”, escreve Eliane no Prefácio do Álbum.
CARTA DA TERRA 1992
“A Carta da Terra, redigida em 1992, pelos povos indígenas como um documento internacional em defesa dos direitos constitucionais é ignorada”, escreve Eliane. “A Carta Magna de 1988, no capítulo dos indígenas, aponta que o sistema econômico viola os direitos. Povos indígenas, quilombolas e população local guardam a identidade e a ancestralidade como maiores patrimônios para vidas futuras, pois o planeta Terra é nosso avô e as mulheres indígenas são sagradas como a natureza”. E, finalmente, do alto de sua militância cotidiana e aguerrida há mais de 40 anos, a escritora considera que: ”Prefaciar uma antologia só de mulheres indígenas, que contam suas histórias como testemunhas das dores sofridas por elas e suas famílias, é o maior presente que eu poderia receber. Outras antologias virão na certeza de tornar mais visíveis as histórias contadas por elas mesmas”.
É um reconhecimento que as jovens escritoras Márcia Kambeba e Aline Kaiapó reforçam dizendo: “Eliane Potiguara lutava sozinha para tornar possíveis os direitos das mulheres e fazê-las visíveis, quando se discutia a questão de gênero e direitos e muitos indígenas não entendiam. Por isso, nós escritoras, cumprimos a excelência na conscientização dos povos por meio de nossas letras indígenas, nos meios de comunicação, nas tecnologias de informação, nos setores educacionais, inclusive político-partidário, pois sem políticas públicas, para nós mulheres e o meio ambiente, não se constrói nada”.
HUMANA E ANTICOLONIAL
Escrito em agosto de 2022, em Jaconé, Saquarema, o Prefácio de Eliane Potiguara anuncia a grandeza dos textos neste Álbum Biográfico do Molherio das Letras Indígenas, como ele mesmo se define, possível através da parceria do Instituto Ela e Mulheres em Movimento, que possibilitaram a impressão desta obra e a veiculação digital, sem fins lucrativos e totalmente com ênfase na disseminação das vozes das mulheres indígenas deste país. Também participou do empreendimento a ANMIGA, com seu apoio fraternal. Também apoiou o projeto a escritora e articuladora Eliane Potiguara. Só assim foi possível realizar esse sonho de revelar muitas escritoras indígenas imersas no anonimato, com o apoio cultural também do Instituto Multiverso, todos construtores dessa obra coletiva que rompe barreiras racistas e culturais, em prol de uma sociedade mais humana e anticolonial.