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Se as árvores falassem…

O professor Ivan Proença e a esposa Ísis na sala da casa que construíram no Condomínio Lago do Paraíso, em Bacaxá (Foto: Edimilson Soares/Arquivo O Saquá)

Ivan C. Proença

Saquarema não deve, diante do atual, e ponderável, crescimento cosmopolita, esquecer o universo de sua extraordinária cultura popular. Inclusive tradição oral, literatura, música, costumes. Durante décadas pesquisei, escrevi e publiquei os fenômenos mais criativos e os pendores artísticos do povo Saquaremense. Como Diretor de Cultura do Estado e Diretor de Projetos Especiais, nos governos Brizola, apresentei nos Teatros João Caetano e Villa-Lobos os artistas de Saquarema. Há mais de 50 anos tenho casa no Município, e trouxe a Saquarema vários escritores notáveis, que escreveram Ensaios, Poesias e Ficção, publicados, sobre o Município, com o apoio inestimável dos arquivos de Erivelto Bravo, cujo avô foi um dos fundadores de Saquarema. Nos anos 80 e 90 publicamos dois livros (Testemunho III e IV) sobre a cultura Saquaremense. Ao longo doso tempos, registrei os artistas e notáveis figuras de Saquarema, inclusive no jornal O Saquá. Desde os músicos Rubinho e esposa, a cantora D. Norma e seu Pedacinho do Céu, “o mais democrático reduto dançante” do mundo, o filho, cantor Tony, a talentosa dupla Luiz e Jeremias (fixos músicos nos shows e bailes do Hotel Serra Castelhana), o baterista Almir, baixista Lélio, tecladista Betinho. Seu Cosme e família, músicos notáveis (Cosminho no pandeiro). A Literatura saquaremense simbolizada na Poesia de José Bandeira (autor do hino de Saquarema), cuja obra nos foi amplamente exposta pela filha Zezé (Maria José); poeta Bandeira, legítimo herdeiro do antológico Parnasiano Alberto de Oliveira (Palmital). A artesã professora Lourdes (e suas figurativas bolas de gude); Nelsinho, professor e artista plástico, cujos quadros não raro eternizam as paisagens saquaremenses. O Ari e seus doces de jiló, o pastel do Caubi. E todos (escritores e eu e Isis) visitamos a significativa sala de ex-votos da Igreja N. Sª Nazaré (cuja lenda, tendendo ao mítico, 1630, debatemos), a gruta “anexa”. E os sambaquis, estudados nos detalhes; os quilombos mereceram pesquisas nossas e visita ao de Bacaxá, onde ocorreu um episódio de confronto. Sugerimos a visita à Igreja N.Sª Conceição e locais onde existiam as Usinas em Sampaio Correia. Poucas informações sobre a seca de 1914 (a lagoa teria sumido). O futebol (campeonato, jogos aos domingos) era paixão. Vinculei-me ao histórico Bacaxá F.C.; levei os jogadores para conheceram o Fluminense (onde fui Diretor e Conselheiro. Hoje, meu filho é Diretor) e a sala de troféus. Trouxe para jogar contra o Bacaxá os juniores, campeões, do Flu e, quando eu estava na Secretaria de Esportes, coloquei a seleção de Saquarema fazendo preliminar de clássico no Maracanã, final de Torneio, Saquá x Maricá, Saquarema campeão. Pesquisamos a Unidos de Bacaxá (e desfile de Carnaval); regiões ermas do município (ritos, crenças, hábitos), Rancho (Itaúna), data festivas, Procissões tradicionais, consultamos o amigo José Viana (proprietário da loja Govil), maçon, sábio da poética de Augusto dos Anjos, sobre usina patriarcal em Sampaio (ele ali trabalhara). E registramos, também em livro, o feirante (feira livre de Bacaxá) dos pregões, transcrevendo-os em livro (aliás, doei livros diversos à Biblioteca do município (em frente à Prefeitura). Alguns dos 14 livros de minha autoria, teorias e críticas literárias e Ensaios em torno da cultura popular brasileira. Escrevi (ou publiquei) Fascículos sobre a cultura Saquaremense. Em palestras pelo país e ou convidado por Festivais de Literatura, muito divulguei as Artes Saquaremenses. E uma “confissão”, como não somos de ferro, fundamos o time (de futebol) “da caneta”, onde eu, Celinho Vignoli e o Peres, jovens, pensamos ser craques. Não éramos. Mas valeu.

Estou quase concluindo este resumo; antes, lembro que fui Secretário de Educação no Município. Não completei dois meses. Pedi demissão por discordar dos critérios administrativos. Neste curto período, destaco a Diretora Professora Amarylis, pelo empenho e pela competência no exercício de suas tarefas no Oliveira Viana.

Ao longo deste 2024, vi, pela cidade, propagandas convidativas para dois “Festivais Literários de Saquarema”. Nas duas ocasiões, “esqueceram de mim”. Nem um modesto convitezinho. Acontece, não é?
Vamos ao momento: ao que tudo indica, o município “bonito por natureza”, está sendo bem administrado. Cidade limpa, atividades cosmopolitas, crescimento visível. Fiquei sabendo de ponderáveis dotações orçamentárias, apreciáveis recursos financeiros. Ótimo para o município, que já viveu épocas de contenção e dificuldades de diversa natureza. Então, sra Prefeita Manuela, uma sugestão: evite, nos eventos (como o Natal) um exagerado festival de luzes estilo “brega Las Vegas”. Agressivo, até chocante. Natal, por exemplo, já abriga uma arvorezinha com os presentes, só. Um horror contemplar tantas árvores, já belas e frondosas, invadidas por fios e lâmpadas intrusos. É luz pra todo lado, e na pracinha de Bacaxá. O povo ate ficará entusiasmado e perplexo no 1º momento, mas, em segundo momento, desconfiará. Por que esse exagero todo? Enquanto isso, penumbra em algumas casas do trabalhador, economizando despesa preocupante, e pensando também na alternância de intensidade (ou ausência) de energia, ambas não tão raras no município.

Nem mesmo o viés religioso contempla tal pirotecnia, tal exuberância, posto que o menino nasceu em meio à humildade, à simplicidade. Exuberantes, só palácios e castelos.

Enfim, menos, srª Prefeita, menos. As festas falam por si.

Desejo-lhes Ano Novo felizes. E justos.

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